RESUMO: Far-se-á uma análise do Código de Ética Profissional do Servidor
Público Civil do Poder Executivo Federal, com base em alguns preceitos
filosóficos de Aristóteles, Cícero, John Rawls, Peter Singer, com ênfase na
conduta ética e moral do servidor no desempenho de suas funções. Com destaque
ao estudo do contexto histórico, das regras deontológicas dos deveres, das
vedações e das Comissões de Ética existentes como princípios norteadores, e a
garantia da devida aplicação no serviço público.
Palavras-chave: ética – moral – deveres –
bem comum.
O presente artigo tem como objetivo fazer uma análise filosófica do Código de Ética Profissional do Servidor
Público Civil do Poder Executivo Federal, com o intuito não somente de
avaliar suas regras, mas também de
discutir problemas relacionados à conduta e às ações dentro do espaço público.
Serão apresentados alguns fatos que ocorreram na história recente do Brasil e
que provocaram a indignação da sociedade e forçaram a criação dos códigos de
ética. Nesse contexto surgem inevitavelmente algumas questões: Mesmo havendo
inúmeras regras delimitando a conduta a ser seguida pelos agentes públicos,
será que os códigos de ética cumprem realmente seus objetivos, ou seriam
necessárias regras mais severas? Qual deve ser a conduta do agente público ao
representar instituições que se apresentam como zeladoras da moral e dos bons
costumes? O Código de Ética Profissional
do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal e o Código de Conduta da Alta Administração
Federal são, de fato, instrumentos adequados para a correção moral dos
agentes públicos? Como resolver a falta de confiança da sociedade na conduta
ética desses agentes e recuperar a crença na probidade moral das instituições
públicas?
O
primeiro capítulo apresenta o “Contexto Histórico”, em que faremos uma
introdução sobre os fatos que motivaram a criação dos códigos de ética e, em especial, as modificações feitas
para seu aprimoramento. Além disso, procuraremos apontar a importância no que
tange à delimitação do padrão de conduta a ser seguido pelos servidores. No
segundo capítulo, far-se-á considerações acerca das “Regras Deontológicas”,
procurando definir alguns conceitos e refletir sobre as regras do código de
ética, utilizando alguns pensamentos filosóficos. Finalmente se discutirá os
“Deveres, Vedações e Comissões de Ética” no serviço público e suas implicações,
com destaque ao papel e importância das instituições, pois: “[...] a forma
institucional da sociedade afeta seus membros e determina, em grande parte, o
tipo de pessoas que queremos ser, bem como o tipo de pessoas que são”[1]. Assim,
ainda neste último capítulo, buscar-se-á questionar as proibições e verificar
se elas servem apenas de orientação, ou se realmente coíbem a improbidade dos
agentes públicos. Finalmente, será estudado o papel das comissões de ética,
visando deliberar sobre sua atual função e a evolução do processo de divulgação
da ética no serviço público.
Contexto histórico
Motivadas por uma somatória de eventos que ocorreram
a partir das diversas tentativas de golpes, as Forças Armadas tomam o poder do
Presidente João Belchior Marques Goulart (1919-1976), dando início ao Regime
Militar em 31 de março de 1964. No Manifesto de 30 de março de 1964, o Chefe do
Estado-Maior do Exército, Humberto de Alencar Castelo Branco (1900-1967)
desencadeia, de certo modo, a rebelião militar. Dois objetivos foram
ressaltados nesse documento, o primeiro era “frustrar o plano comunista de
conquista do poder e defender as instituições militares; o segundo era
restabelecer a ordem de modo que se fizessem reformas legais”[2]. No
final da ditadura, segundo o Regime Militar, o Brasil viria a sofrer um difícil
processo de redemocratização e que aos poucos ressurgiriam os partidos
políticos, o retorno dos exilados e o direito de escolha pelo voto.
Skidmore faz
menção que no início dos anos 80 ocorreram algumas manifestações públicas de
reivindicação por eleições presidenciais, em decorrência das crises econômicas
geradoras do aumento da inflação e da queda do crescimento. Tais fatos
contribuíram decisivamente para forçar as eleições indiretas de 1985 para
Presidência da República. Na ocasião, Tancredo de Almeida Neves (1910-1985), do
Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), é eleito por modo indireto,
mas veio a falecer antes mesmo de tomar posse. Em seu lugar, assume José Sarney
de Araújo Costa, após mais de duas décadas de Regime Militar. Nos primeiros
anos de governo, procurou consolidar a democracia brasileira. Paralelamente, o
Brasil se encaminhava para um quadro histórico de hiperinflação e moratória. O
primeiro Presidente da República eleito por voto direto, após o Regime Militar,
em 1989, Fernando Affonso Collor de Mello torna-se rapidamente alvo de
denúncias de corrupção. Acabou renunciando ao cargo, na expectativa de evitar
um processo de impeachment,
fundamentado em acusações de corrupção. Itamar Augusto Cautiero Franco assumiu
interinamente a presidência, em meio a uma grave crise econômica deixada por
Collor.
Pelo Decreto nº
1.001, de 6 de dezembro de 1993, foi criada
uma Comissão Especial com a finalidade de elaborar um Código de Ética Profissional do Servidor
Público Civil do Poder Executivo Federal [3], sendo
aprovado pelo então Presidente da República Itamar Franco, por meio do Decreto
nº 1.171, de 22 de junho de 1994, organizado em dois capítulos, 3 Seções, no
total de XXV regras. Segundo Romildo
Canhim, Ministro de Estado Chefe da Secretaria da Administração Federal da
Presidência da República e Presidente da Comissão Especial, o referido código foi elaborado em decorrência do atual momento:
O Brasil defronta-se, nos últimos anos, com uma crise
que, ultrapassando a dimensão econômica e social, incide sobre a esfera dos
valores éticos, colocando em risco o alcance de uma organização democrática
justa e digna. O acirramento desta crise suscitou a indignação da sociedade e
expressou-se no movimento pela Ética [...] mobilizando amplos setores para a
reconstrução do Estado e para a transformação de padrões de conduta profundamente
enraizados na cultura nacional.[4]
Essas crises ocorridas no Brasil
nos anos anteriores acabaram incidindo sobre os valores morais, pondo em risco
as instituições que se apresentam como zeladoras da moral e dos bons costumes.
O agravamento dessas crises provocou a indignação da sociedade, refletindo-se
em movimentos que forçaram as autoridades a criar um código de ética, visando à
regulamentação da conduta dos agentes públicos. Chegou-se ao ponto de alguns
servidores públicos aceitarem práticas não éticas, algumas das quais eram até
mesmo estimuladas em algumas instituições e situações para se burlar o sistema,
pois existem condutas impróprias, até mesmo em países desenvolvidos, com o
intuito de beneficiar pessoas, empresas, políticos e seus partidos: em nosso
país seria diferente? Nesse contexto, poderíamos questionar: não levaria a
burocracia necessariamente à corrupção? No Brasil práticas corruptas são tidas,
em certas ocasiões, como necessárias para superar barreiras burocráticas,
difíceis de serem contornadas, segundo as normas vigentes. Em algumas situações
do processo de licitação acontecem casos nos quais há recursos para aquisição
de certo produto, entretanto, precisa-se de outro. Por exemplo: precisa-se de
cartuchos para impressoras em uma organização pública, contudo não há recurso
financeiro para tal aquisição. Têm-se recursos apenas para compra de resmas de
papel, porém não existe essa necessidade. Um dos meios utilizados para burlar a
barreira burocrática seria utilizar o recurso das resmas para a compra dos
cartuchos, sendo que constaria na nota fiscal a compra de papel, embora o
material entregue seria cartucho.
[1]
RAWLS, John. O Liberalismo Político.
São Paulo: Ática, 2000, p. 322.
[2]
SKIDMORE, Thomas E., Brasil: de Castelo
Branco A Tancredo, 1964-1985. Tradução: Mario Salviano Silva; Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1988, p. 45.
[3] Neste trabalho utilizaremos a
abreviatura Código para falar do Código
de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal,
para Capítulo, Seção e Regra, usaremos algarismos.
[4]
BRASIL. “Apresentação”. In: Código de
Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal.
Brasília: ENAP, 1994. p. 4.
* Trecho do livro: REFLEXÕES FILOSÓFICAS, do escritor Rogério Corrêa
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Boa leitura,
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